Reiki como PrÁtica poética
Vive-se numa tensão permanente. Na Baixada, na Zona Oeste, e em outros territórios no Rio de Janeiro e no Brasil, os quais vivem com as consequências de décadas de negligencia e violência do (cometida ou permitida pelo) Estado.
O corpo está sempre em alerta: barulho de tiro, polícia na esquina, o medo constante de não voltar para casa. Nesses contextos, práticas de cuidado que parecem simples ganham outra dimensão: tornam-se ferramentas de sobrevivência, de resistência e de auto-defesa. O Reiki é uma delas.
A origem da palavra e da prática
Reiki é uma palavra japonesa formada por dois ideogramas: rei, que significa universal, e ki, energia vital. É, portanto, a energia vital universal que circula em tudo o que existe. Mikao Usui, no início do século XX, sistematizou essa prática no Japão como uma forma de cuidado acessível, transmitida através das mãos. Desde então, espalhou-se pelo mundo e foi recriada em diferentes contextos.
No Brasil, chegou inicialmente pelas classes médias urbanas. E ainda esta longe de ser apropriado e reinventado em contextos populares — em associações de bairro, rodas de cuidado em comunidades, oficinas em escolas públicas.
Como acontece com tantas terapias complementares , ainda se mantem como privilegio das camadas de classe media alta. Ainda esta no processo de ser ressignificado e se tornar pratica cotidiana nos territórios, que como efeito de décadas de subjugação racial, expropriação econômica, e dominação colonial deixaram, lidam com precariedade e vulnerabilidade sistemáticas,.
Enfim, o Reiki ainda é considerado um luxo terapêutico. E é por isso que precisa ser redirecionada e transformado numa ferramenta cotidiana de cuidado e item essential no arsenal da luta.
O gesto simples: mãos que cuidam
O princípio do Reiki é simples: colocar as mãos sobre o corpo e deixar a energia fluir. Parece pouco — mas nesse gesto está inscrita uma sabedoria ancestral. Desde sempre, mães, avós e curandeiras colocam a mão sobre a cabeça de uma criança com febre, sobre o coração de alguém em desespero, sobre o ombro de quem precisa de força. O Reiki organiza essa intuição: ensina posições, técnicas de respiração, formas de sustentar a energia vital.
Não há mistério ou complicação: não precisa de remédios, máquinas ou templos. Basta presença, atenção e as próprias mãos.
Benefícios para o corpo e a saúde
Pesquisas científicas já demonstraram que práticas como o Reiki ajudam a reduzir o estresse, melhorar a qualidade do sono, equilibrar a pressão arterial e aliviar dores. O relaxamento profundo induzido pelo Reiki ativa o sistema nervoso parassimpático, responsável por restaurar o corpo e acalmar a mente.
Em territórios onde o estresse é crônico — marcado pela violência, pelo abandono do Estado, pela insegurança alimentar — o efeito é ainda mais visível. Uma sessão de 10 minutos pode devolver ao corpo a sensação de calma, permitir que o coração desacelere, que o sono venha, que a respiração encontre ritmo.
Reiki como auto-defesa
Mas o mais importante é compreender que Reiki, nesses contextos, não é apenas prática de saúde individual. Ele se torna uma ferramenta de auto-defesa coletiva.
Auto-defesa não significa apenas reagir a uma agressão física. Significa também sustentar o corpo e o espírito para não sucumbir ao medo e ao esgotamento que a política de extermínio produz.
Quando mulheres se reúnem para aplicar Reiki umas nas outras antes de uma assembleia, estão construindo um escudo invisível. Quando jovens praticam Reiki para lidar com a ansiedade, estão criando condições de seguir estudando, organizando, sonhando.
No Curso Luz Negra - Programa de Estudos Subcomuns, o Reiki é uma pratica poética de auto-defesa, de cuidado psíquico (emocional e espiritual) e cultivo da intuição. Este não elimina a violência estrutural, não substitui as formas de mobilização por direitos, demandas para que o estado cumpra seu papel, e engajamento politico. O pratica de Reiki ajuda a manter e proteger a infraestrutura psíquica, criando um campo de calma, aliviando o estresse, a ansiedade, e assim prevenindo (e complementando o tratamento medico da) pressão alta.
Simples, gratuito e acessível
O Reiki tem uma força radical: é simples, gratuito e acessível a todas as pessoas. Não exige equipamentos, diplomas ou grandes estruturas. Pode ser aprendido em oficinas comunitárias, em cursos online, praticado em casa, compartilhado em rodas. É, portanto, uma ferramenta radical e democrática de cuidado.
E justamente por ser simples, não substitui o Estado, nem médicos, nem políticas públicas. A escola, o hospital, o posto de saúde continuam sendo responsabilidades do poder público. O Reiki é complemento: um apoio que fortalece quem luta por esses direitos, sustentando o corpo e o coração no processo.
Conclusão
Em um mundo onde a violência e o abandono tentam nos desgastar, Reiki é uma prática que devolve energia, clareza e calma. Não é mágica, não é substituto de direitos, mas é força suave que sustenta a resistência cotidiana.
Reiki é um gesto de mãos, mas também de esperança. É auto-defesa poética: uma maneira de transformar cuidado em força, e força em comunidade.